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Brasileiro conta drama dos refugiados: “Incerteza e exaustão”

André Naddeo, diretor da ONG Planeta de Todos, conta ao Metrópoles os desafios de fugir da guerra e como os ucranianos estão sendo recebidos


Foto: Paul Zinken/picture alliance via Getty Images

Eles deixam para trás casas, histórias e sonhos. Carregam pouco, quase nada. Roupas, fotos e medo. A rotina dos refugiados ucranianos revela como uma guerra é capaz de destruir não só cidades, mas toda perspectiva de futuro. Quem foge da Ucrânia, após a invasão russa em 24 de fevereiro, não busca apenas um abrigo. Precisa de uma nova morada, um novo lar.

A fuga chega a durar 10 dias. O caminho é difícil, arriscado. É preciso escapar de bombas, de mísseis, da mira de fuzis – e do frio, da fome, de doenças. Os refugiados – mulheres e crianças são maioria – dormem amontoados em estações de trem. Supermercados servem como pontos de acolhimento.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o número de refugiados pode chegar a cinco milhões de pessoas. Em média, 140 mil ucranianos deixam o país todos os dias desde o início do conflito.

O mundo acompanha os desdobramentos das negociações entre os presidentes Vladimir Putin, da Rússia, e Volodymyr Zelensky, da Ucrânia, em busca de cessar-fogo e resolução pacífica para a guerra no Leste Europeu.

Enquanto isso não ocorre, uma quantidade incalculável de pessoas tenta fugir da guerra e conta com a ajuda de países, organismos internacionais, gente desconhecida e voluntários, como André Naddeo, diretor da ONG Planeta de Todos, grupo brasileiro de auxílio a refugiados.

Em conversa com o Metrópoles, na sexta-feira (11/3), André contou o que viu e o que viveu ao passar pela fronteira da Ucrânia com a Eslováquia, até chegar à Polônia. Lá, ele esteve cara a cara com o front. “As pessoas chegam, tomam água, café, vão ao banheiro. Muitos tradutores ajudam. O primeiro passo é acalmar as pessoas”, sintetiza sobre a recepção.

O relato, registrado em vídeo, enquanto ele estava em Przemysl, cidade polonesa distante 400 quilômetros da capital, Varsóvia, e na fronteira com a Ucrânia, ocorreu em uma estação de trem que serviu de base para refugiados da Ucrânia — país historicamente aliado da Rússia.


O desacordo entre as nações começou com o desejo ucraniano de ingressar na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), aliança militar coordenada pelos Estados Unidos.

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista de André Naddeo.

Como estão as coisas por aí?

O fluxo de refugiados ucranianos é constante. Chegamos à noite, e o fluxo é 24 horas. São pessoas que estão em trânsito. Elas estão cansadas, querem dormir, vão para o alojamento e precisam decidir os próximos passos. Se tem um parente, um conhecido em Varsóvia, explicam a situação e adquirem a passagem de trem ou ônibus. Aqui há muitos ônibus de portugueses, espanhóis, que vieram de longe para oferecer essa oportunidade para os refugiados.

Como está esse processo e a recepção, considerando a pandemia de Covid-19?

Não há quase ninguém de máscara. Dentro da estação [de trem] ninguém usa. O tema coronavírus não é muito presente nessa crise de refugiados da Ucrânia.


Qual é o estado emocional das pessoas que estão chegando aí?

É um cansaço absoluto. De Kiev [capital ucraniana] para a fronteira é um caminho muito longo. Não existem ainda vias seguras, corredores humanitários estabelecidos. As pessoas se arriscam. São jornadas de sete, 10 dias. Pessoas que chegaram ontem e saíram do país no início do conflito.

Qual o perfil dos refugiados?

É uma crise de refugiadas, porque o pai tem que ficar [a Ucrânia impede homens de 18 a 60 anos de deixarem o país; precisam ficar e ajudar no esforço de guerra]. Nas famílias com três ou mais filhos, o pai é liberado e eles podem acompanhar. Vemos muitas crianças. Metade das pessoas que cruzaram a fronteira são crianças. É uma desorientação. As pessoas não sabem quais são os próximos passos, têm esse sentimento de stand-by. As pessoas não queriam sair da Ucrânia, ficar longe. É um clima de incerteza. Tem uma carga psicológica muito grande. Vou poder voltar para casa? Vou ter que morar em outro país?

Como está o acesso a água, comida, aquecimento e local para dormir?

Está organizado. Passamos por um supermercado desativado que foi transformado em ponto de acolhimento. Os refugiados que não sabem o que fazer têm local para dormir, água, refeição. É como se fosse um festival. Há comida vegana, churrasco, comida até para pet. Vieram voluntários de vários países para ajudar. Há roupa. Foi uma organização grande da comunidade europeia para acolher esses refugiados.

O que os refugiados carregam?

Muitas fotografias, bichos de estimação, roupas, faz muito frio, e celular [as companhias estão disponibilizando conexão]. Não dá para trazer muita coisa. São mulheres, mães, que têm de ficar atentas. Traz o básico, o essencial, como passaporte. Mesmo quem não tem o documento consegue permissão temporária para ficar.

Os poloneses apoiam o país entrar no conflito?

Existe um sentimento muito claro. Está enraizado. Os poloneses no pós-guerra sequer podiam falar polonês. Acredito que por isso eles abriram os braços dessa forma.

Por Otávio Augusto, Olavo David/Metrópoles

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