Títulos de renda fixa estão muito distantes de uma rentabilidade que chegue perto daquela que foi prometida pelos golpistas, enquanto pelo investimento em ativos de renda variável não é possível garantir o lucro das aplicações.
Cesar Greco/Agência Palmeiras |
Com apenas uma informação, os jogadores do Palmeiras que tiveram prejuízo milionário ao investirem em uma empresa de criptomoedas poderiam ter evitado a dor de cabeça: a promessa de lucro de 5% ao mês, garantida em contrato, está completamente fora da realidade dos principais produtos financeiros disponíveis no mercado.
Conforme o Fantástico mostrou com exclusividade neste domingo (12), o meia Gustavo Scarpa (atualmente no Nottingham Forest FC) investiu R$ 6,3 milhões em criptomoedas, em uma aplicação indicada por Willian Bigode (atualmente no Fluminense). Um lucro de 5% ao mês seria o equivalente a quase 80% ao ano — quase seis vezes mais do que a taxa Selic, que é referência para os juros no país.
"Quando a gente fala de investimentos, tudo que vai acima da taxa Selic começa a ter risco. Quanto maior é a rentabilidade possível, maior a possibilidade de perda. O risco é isso: tem chance de ganhar e tem muita chance de perder", explica Thiago Godoy, educador financeiro da Rico.
Como mostrou o g1 nesta segunda-feira (13), Scarpa poderia ter rendimentos próximos de R$ 1 milhão ao ano com uma carteira de investimentos conservadora e bastante segura.
Rendimento muito acima do padrão
Dentro dos títulos de renda fixa, há três divisões principais e que costumam ter rentabilidade atrelada à Selic, à inflação pelo IPCA ou por uma taxa prefixada. Em todos, os juros pagos ao investidor não fogem do patamar dos juros básicos do país.
O Tesouro Selic ou títulos de renda fixa atrelados ao CDI rendem próximos à taxa básica de juros, hoje em 13,75% ao ano. Os títulos vinculados ao IPCA costumam pagar a inflação do período mais um extra de 6% a 8% — que também não passam dos 15%. Os prefixados também rondam esse degrau e pagam as taxas prometidas no momento de investir.
A única possibilidade de buscar taxas mais altas é partindo para a renda variável. Mas especialistas fazem questão de frisar que a rentabilidade anterior desses ativos não pode ser usada como garantia de algo similar no futuro. Ou seja: é possível que uma ação na bolsa, por exemplo, valorize 5% em um mês (ou 80% em um ano). Mas é impossível assegurar que fará o mesmo no ano seguinte.
"Isso pode acontecer durante um período, com uma ou outra empresa. Por isso que a gente sempre fala sobre a diversificação de investimentos: uma empresa que valoriza muito é ótimo, mas ela pode desvalorizar muito mais do que isso. Um exemplo muito recente disso é a Magazine Luiza", explica o educador.
Um levantamento feito pelo Trademap mostra que os rendimentos nos últimos 12 meses das principais aplicações estão longe da cifra prometida no golpe. O g1 escolheu recortar a análise dentro da janela de 12 meses porque é o comparativo mais usual dentro do mercado.
O CDI, título emitido por instituições financeiras para equilibrar as operações entre os bancos, teve rentabilidade de 13,01% nos 12 meses terminados em fevereiro. A poupança também registrou rentabilidade positiva no período, de 8,18%.
Ativos que tiveram uma supervalorização são exceções no mercado. Um exemplo são os papéis da companhia Cielo, que valorizaram mais de 105% nos últimos 12 meses. Mas é a única ação do Ibovespa que valorizou acima do patamar prometido no caso do golpe contra os jogadores do Palmeiras. Além disso, a Cielo acumula queda de 2,63% em 2023.
Não bastasse, as empresas envolvidas no golpe prometiam rentabilidade após investimentos em criptomoedas. No último ano, contudo, o mercado cripto tem sofrido com a subida das taxas de juros ao redor do mundo, que aumenta a aversão a risco entre investidores e prejudica os ativos mais arrojados — o que é o caso.
A principal criptomoeda em circulação, o Bitcoin, teve rentabilidade negativa de 44,86% nos últimos 12 meses. Mesmo o HASH11, principal ETF de criptomoedas do Brasil e que simula a performance do mercado de cripto, caiu 43,16% no último ano. É um cenário de duplo prejuízo: uma empresa promete pagar 5% ao mês aos investidores, enquanto aplica em ativos que colhem prejuízos.
Por que o mercado de renda variável está em alerta
Parte da explicação para esse mau momento dos ativos de renda variável é o reflexo do sentimento de aversão ao risco que tomou os mercados nos últimos anos. Ele é fruto principalmente da crise econômica decorrente das medidas restritivas da Covid-19 e foi intensificado com a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Esse cenário se refletiu na subida de juros nas principais economias do mundo, principalmente dos Estados Unidos. O Federal Reserve (Fed) fez sucessivos aumentos ao longo de 2022 e a taxa de juros americana passou de 0,25% ao ano em janeiro de 2022 para o intervalo de 4,25% a 4,5% ao ano em dezembro.
Juros mais altos nos EUA elevam a atratividade de se investir na segura renda fixa norte-americana, o que tende a aumentar o ingresso de recursos na maior economia do mundo e tirar dinheiro de ativos de maior risco.
As cotações das moedas digitais têm por natureza uma variação muito intensa. E, além disso, também acompanham essa movimentação do mercado — e a queda de ativos de maior risco.
Com informações do g1 - Thaís Matos
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